Alguns comentários sobre o texto-base para o Ano Catequético Nacional – 2009

 

Há alguns dias gastei meu rico dinheirinho e adquiri o texto-base para o Ano Catequéticoanocatequetico Nacional – 2009, elaborado e editado pela CNBB. Com todo o respeito que é devido aos senhores Bispos, só não digo que foi dinheiro jogado fora porque me serviu para trocar o dinheiro que precisava. Não posso fazer uma análise muito mais profunda do que vou fazer aqui pois não tive estômago para ler o livreto todo (64 pp.). Vamos aos breves comentários que justificam o meu repúdio ao opúsculo.

 

1. Bibliografia. O primeiro absurdo do documento é que à p. 61, onde estão as siglas e abreviaturas de outros textos e documentos citados, simplesmente não consta o Catecismo da Igreja Católica. Questão de ordem: como pode haver um texto que pretende ser subsídio básico para uma miríade de tarefas pastorais tendo como fim a catequese, sem ao menos citar o Catecismo?

 

2. Método. Para começar, o léxico do texto base é confuso. Lança mão de sentenças simplesmente vazias de sentido, numa linguagem de burocrata semelhante aos livros de auto-ajuda para executivos:

A ação evangelizadora da Igreja deve ser resposta consciente e eficaz para atender as exigências do mundo de hoje com indicações programáticas concretas, objetivos e métodos de trabalho, formação e valorização dos agentes e a procura dos meios necessários que permitam que o anúncio de Cristo chegue às pessoas.

De fato, a fragilidade dos métodos e das ações só aponta para a fragilidade dos objetivos do documento. O ver-julgar-agir, gloriosamente ressuscitado no Documento de Aparecida aparece aqui como modelo da ação catequética. Aqui, o ‘ouvir’, cerne e núcleo da catequese virou um falatório caótico ao definir que ‘Jesus é a resposta aos problemas humanos’ (p. 29). Não se deve achegar a Ele e escutá-Lo porque é a Salvação em pessoa, mas agora devemos nos aproximar em vista da resolução de nossos problemas. Ou São Paulo estaria defasado pedagogicamente ao dizer claramente que ‘a fé vem pela audição’ (ex akoês, em Rm 10,17)?

3. Quais princípios? O ponto no qual desejo me concentrar é o item ‘Princípios da animação bíblico-catequética?. Vejamos o que nos diz o texto:

As Escrituras ocupam lugar primeiro nas diversas formas do Ministério da Palavra, não só na pregação, mas também na Catequese. O Concílio Vaticano II chamou a atenção para a centralidade da Palavra de Deus na vida do cristão […] Assim, a fonte primeira da Catequese é a Bíblia, constituindo-se em seu ponto de partida, fundamento e norma. (pp. 48-49)

Como já comentei aqui, o Concílio Vaticano II é a citação preferida dos que pretendem legitimar qualquer bobagem. Contudo, vejamos o que nos diz a Constituição Dogmática Dei Verbum sobre a Revelação Divina:

9. A sagrada Tradição, portanto, e a Sagrada Escritura estão intimamente unidas e compenetradas entre si. Com efeito, derivando ambas da mesma fonte divina, fazem como que uma coisa só e tendem ao mesmo fim. A Sagrada Escritura é a palavra de Deus enquanto foi escrita por inspiração do Espírito Santo; a sagrada Tradição, por sua vez, transmite integralmente aos sucessores dos Apóstolos a palavra de Deus confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos, para que eles, com a luz do Espírito de verdade, a conservem, a exponham e a difundam fielmente na sua pregação; donde resulta assim que a Igreja não tira só da Sagrada Escritura a sua certeza a respeito de todas as coisas reveladas. Por isso, ambas devem ser recebidas e veneradas com igual espírito de piedade e reverência.

E ainda:

É claro, portanto, que a sagrada Tradição, a sagrada Escritura e o Magistério da Igreja, segundo o sapientíssimo desígnio de Deus, de tal maneira se unem e se associam que um sem os outros não se mantém, e todos juntos, cada um a seu modo, sob a ação do mesmo Espírito Santo, contribuem eficazmente para a salvação das almas.

  Os veneráveis senhores bispos parece que esqueceram coisas básicas sobre a doutrina da Revelação tal qual a Igreja Católica a entende. Ou viramos todos protestantes adeptos da tese da Sola Scriptura? Nos diz o Catecismo Romano:

But every sort of doctrine which is to be delivered to the faithful is contained in the word of God, which is divided into Scripture and Tradition.

Ora, por que o texto-base não aponta também o Catecismo, bem como as outras manifestações do Magistério, como fontes primárias da catequese? E o Credo como objeto principal da explicitação catequética? O texto-base composto pela CNBB cita inúmeras vezes seus próprios documentos, como o de Aparecida, o Diretório Nacional de Catequese entre outros, e no máximo, se limita a apontar as Constituições do Vaticano II sem, é claro, lê-los como se deve, como visto acima.

De fato, a catequese é o problema principal da Igreja hoje. Somente com ação catequética densa e contínua garante uma boa vivência comunitária, bem como o desdobramento das vocações religiosas e leigas. Nada se ganha com a transformação da catequese num processo vazio que não acarreta verdadeira conversão, sob o pretexto de torná-la mais palatável.

E a CNBB erra novamente.

7 comentários Alguns comentários sobre o texto-base para o Ano Catequético Nacional – 2009

  1. Fabiano Sampaio

    ? de se esperar o m?ximo de confian?a de uma institui??o que se coloca como s?ria em sua tarefa de ser agente n?o meramente de mandamentos, mas de ensinamentos (que pressup?em uma compreens?o do que se faz, logo uma necessidade de reflex?o, que necessariamente passa pelo crivo da raz?o) da Santa S?.
    Como ? poss?vel ent?o que falte o b?sico de considera??es criteriosas na hora de redigir e editar um material que deve ser a divulga??o dos ensinamentos teol?gicos inscritos nos documentos oficiais do Santo Magist?rio? Ensinamentos teol?gicos que n?o carecem de racionalidade na medida em que seus argumentos s?o constru?dos com coer?ncia e coes?o, justamente os dois pontos que parecem faltar na publica??o do Ano Catequ?tico feito pela CNBB.
    Ent?o deve valer o gasto de ter, para poder desenvolver ainda mais o senso cr?tico sobre ela.

  2. Ricardo Alexandre da Silva

    Prezado Gabriel:

    Boa tarde.

    N?o se poderia compreender que o texto compreende os documentos do magist?rior como inclu?dos na express?o “Sagrada Tradi??o”?

    Ainda que assim se compreenda, contudo, ? fato que a omiss?o bibliogr?fica da CNBB, ao olvidar o Catecismo, n?o ? justific?vel.

    Um forte abra?o,

    Ricardo Alexandre da Silva.

  3. Gabriel Ferreira

    Caro Ricardo.

    N?o sei se voc? n?o atentou para isso, mas a express?o “Sagrada Tradi??o” que consta no post, ? da cita??o que eu fa?o da Dei Verbum, que ? uma constitui??o do Vaticano II e n?o do texto da CNBB.
    Veja l?.

    Grande abra?o e obrigado, novamente, pela leitura.

  4. Ricardo Alexandre da Silva

    Gabriel:

    Boa tarde!

    Quando li seu texto a primeira vez, interrompi a leitura para atender a um telefonema. Mesmo assim devo admitir que isso n?o justifica meu erro!

    Que bola fora terr?vel!!!…

    Feito meu mea culpa, s? me resta parabeniz?-lo pelo post recente sobre ate?smo. E tamb?m agradecer pela indica??o, em outro post, sobre a tradu??o do texto de S?o Tom?s de Aquino diretamente do lati.

    Fraterno abra?o,

    Ricardo Alexandre da Silva.

  5. Aneani Assis Mendes

    o texto besico esta mais claro que as parabolas,somente pensando como os discipulos de Ema?s ? que percebemos o quanto estamos fieis (buli) fieis de pouca f?! e necessario buscar na biblia para melhor entendimento!

  6. G. Ferreira

    Aneani. De fato o texto ? claro. Claro e errado. A li??o fundamental a aprender no caminho de Ema?s ? o seguimento: o oposto do que prega o antiromanismo da CNBB.
    Abs.

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